quarta-feira, 31 de março de 2010

Os girassóis


Così, tantti italiani sono Terra Brasile!
Come fa milioni di Girasoli

 

sábado, 6 de março de 2010

A longa viagem

Giovanna acholhia o pequeno Cirillinho junto ao seu corpo, protegendo-o da fina garoa que tomava o Porto de Santos, naquele Fevereiro de 1896. Desciam acompanhando o grande grupo de italianos, sabendo que seriam levados à "Pensione de Immigrazione" na cidade de São Paulo. Estavam felizes por alcançar terra firme - a viagem havia esgotado suas energias e ainda imaginavam que era um passeio e que voltariam a San Marino. Mas ali não era a Itália, era a América. Agora, em terra firme, remetiam-se a um novo tempo, que sua terra Itália estava tão distante dali, deste tempo e deste novo lugar que chamavam Brasile. Lembravam da viagem de carroça pela Toscana até o embarque que não pode ser feito em Gênova, tendo ainda que seguir até Napoli. Que vigem tão longa, parecia não ter fim. Terminavam uma iniciada na Itália. Mas começava outra: a longa viagem pelo Brasil e suas cores e cheiros. Assim parece ser também a vida, seja pela viagem do amor, ou dos conflitos, sempre estamos a querer viajar.

Nesse trânsito do desembarque, avistavam  mulheres e homens de pele escura, o que chamou a atenção de Angelo, não porque não estivessem acostumados com as raças mestiças do Brasil, mas porque os negros, cafusos, mamelucos, estavam ao lado de enormes sacas gritando e acenando para os novos brasileiros. Arqueavam galhos e sombreiros improvisados, de forma a proteger sacas e sacas abertas e providas de um lindo amarelo granulado. Aquilo impressionou o jovem Angelo de tal maneira que se desgarrou do grupo e rumou em direção aos gritos dos mestiços. Giovanna ainda disse: - figlio mio vene qui prego! Já era tarde! Angelo postou-se ao lado de uma das sacas e olhou com profundo espanto. Giovanna se apressou em alcança-lo, a esta altura também tomada de curiosidade pelo povo negro, pelas cores fortes do Brasil, e pelo cheiro de terra molhada, que muito mais tarde levaria consigo na mais remota lembrança. Segurando o braço de Angelo, disse: -andiamo Anjol! Ele hesitou e olhou para a mãe dizendo estupefato:
-Mamma.....guardate questo! Come sacchi di molti dei formaggi grattugiato!
- Mio figlio no si avvicina.......... Giovanna olhou sorridente para a mulher negra ao lado das sacas e perguntou:
- Che cosa è? apontando para as sacas. Antes mesmo que a mulher respondesse Anjol apressou-se dizendo que era queijo, - queijo ralado, mamãe que tanto de queijo ralado!, em centenas de sacas..... 
A negra se acostumando aos imigrantes olhou-a, também um pouco sem entender e disse:
- É bão pra comer com feijão!
Sorriram uma para outra, Giovanna mais querendo conhecer o povo do Brasile, mirou profundamente o olhar a negra e se encantou tanto quanto Angelo com a farinha, que de fato parecia queijo lascado.
Giovanna insistiu: - È formaggi? mostrando com a mão uma bola, como um queijo.
A vendedora acostumando ao novo mundo de liberdade estava também curiosa com a comunicação, e logo percebeu que se espantavam pensando que a sua farinha era queijo ralado. E sorriu ainda mais, escancarando os dentes brancos que Giovanna apreciou com interesse. Emedando a resposta, a mulher negra: - Não, non! Sorrindo ainda mais estendeu uma saca menor que tinha nas mãos ao pequeno Anjol, para que ele provasse e logo depois para Giovanna que como boa italiana pegou uma farta porção e experimentou sem ressalvas. A negra perguntou:
- É gostoso num é? Num é bão madame?
Giovanna acenou positivamente e disse que tinham que ir, que agradecia mas não ia comprar nada ainda. Tudo em italiano, assim que a vendedora prestou muita atenção e a tudo acenava que sim, que obrigado também, que eles eram benvindos no Porto, já que a negra não sabia bem sobre o destino do italianos, pensava mesmo que eles iam ser escravos também. Mas como podia uma mulher tão apessoada e bem vestida ser escrava. Não entendia.
Giovanna seguiu com Angelo. - Mio figlio sono borse di farina... mi pare di sì. Una farina altre.... buona non? Anjol disse: - Sì mamma è buona sì, piuttosta secca... Giovanna olhou para achar o resto de sua família e viu Rita e Florida acenarem: - Qui, qui, qui.... qui Anjol gritavam todos! Alegrando-se por estarem em algum lugar novo, e felizes por verem o olhar mais tranquilo de seus pais.............. estavam felizes! E encantados, as crianças estavam encantadas! Até Eliseo que era mais tímido e sério como o pai, estavam pulando e sorrindo para Giovanna no meio da gritaria de Rita, Florida e Anjol. Giuseppe segurava na mão do pai ainda meio assustado e sonolento, puxando Tuda (Maria Gerturdes) que com a outra mão na boca escondia o sorriso.

Juntaram-se às filas de conterrâneos italianos, aguardando sua vez para ir à Hospedaria da Imigração em San Paolo.... Isto já sabiam -  iriam para uma cidade que se chamava San Paolo, e que poderiam ficar na pensão por até seis dias, no sétimo deveriam sair e ir para colônias de trabalho. Para 'lavorar' para famílias de fazendeiros do Brasile. Carregavam todas as coisas que sobraram da travessia pela Toscana. Especialmente a máquina de costura, pequena mas tão boa e que entreteu Giovanna em toda a viagem, não só para sua família mas para os outros italianos e famílias que fizeram como amigos nos meses de viagem. A princípio pensavam em cinquenta dias de viagem, mas acabaram mais de dois meses no Edilio Raggio - o navio que os trouxeram. Isso porque não puderam embarcar em Gênova. Atrasaram a viagem ainda mais. A garoa estava passando....... e no tempo que esperavam o trem para subir do Porto de Santos até a hospedaria em São Paulo, o sol se abriu e um lindo céu azul se mostrou na baía...... admiravam encantados a cor do mar em extensão até o horizonte com o azul do céu. Giovanna achou lindo, mas apesar da alegria dos filhos, sentia um pedaço dela se quebrar ali naquele azul e no calor que fazia, pelos meados da meia tarde. Desatando suas blusas, buscando água para dessedentar os filhos e o marido..... se lembrava do girassóis e do amarelo e verde dos campos da Toscana. Pensava na sua cozinha e na sua família em San Marino. Pensava nas torres e no natal em que se apaixonou por Guglielmo. Não sabia de sua coragem em passar pelo que passaram em toda a Toscana, nas dificuldades até Gênova e a frustação do embarque, depois Napoli........e nesta longa viagem que começavam no Brasil.

O Trem apitava! Um 'piuí' forte, sonoro.  Era hora de embarcar! Com os olhos cheios de lágrimas envolveu o seu marido pelo pescoço e o beijou: - Io ti amo di amore! Eu te amo de amor! Guglilemo a aconchegou, cercados pelos sete filhos, que aos poucos iam se apegando em suas cinturas e pernas........ o choro de Cirillo no braço de Giuseppe se misturou com a voz rouca do brasileiro agente de imigração chamando as famílias: - Guilhermo Staquiarini? Sr. Guilherme Stacciarini? Sr. Guilherme - "Guglilemo Stacciarini"? Onde Está? - Sí, o pequeno Eliseo levantou a mão, seguido de todos os filhos do casal, com as mãos estendidas para o alto. - Andiamo senhores, andiamo ao "hostelaria", per favor, vamos senhores! Por aqui, por favor, dizia insistindo. Acolhidos uns aos outros entraram no vagão, indicado pelo guarda de imigração, e nos assentos continuaram todos abraçados como se nunca mais fosse se separar. Ao apitar, na partida para a longa viagem nas terras brasileiras, Giovanna ainda olhou para trás e fixou bem a imagem do Edilio Raggio. Os seus pensamentos juravam naquele olhar que logo, um dia, um tempo que fosse, voltaria a sua terra, a Itália. Olhou para o Edilio Raggio até enquando pode, vendo o navio desaparecer nas curvas que o trem fazia, partindo com sua família para San Paolo; a embarcação foi sumindo entrecortada pelo azul do céu e o intenso verde da montanha que se abria. Novamente quis chorar, apertando seu pequenos filhos junto a si.

Agradecimento,
a Luzia Stacciarini Capucci, pelas inúmeras descrições de Giovanna e esta cena do porto.


Notas:
A viagem da Itália ao Brasil não pode ser feita a partir de Gênova, não conseguiram embarcar. As características das famílias Stacchini e Stacciarini não foram aprovadas em Gênova, pelos antecedentes do Conde Stacciarini e a posição política no contexto italiano, de importância para o desenvolvimento italiano. Isto pois, os fizeram ir de Gênova a Napoli, de onde então conseguiram driblar a situação e embarcar no Edilio Raggio. Mas essa história contamos depois!
O que significa Edilio Raggio? O nome do navio que transpõe a história dos Stacciarinis para o Brasil.
- Edilio Raggio (Novi Ligure, 1840 – 22 ottobre 1906) è stato un imprenditore italiano, ed onorevole del Regno d'Italia. Laureato in Giurisprudenza, non esercitò mai l'attività forense.  Fondò da giovane nell'area novese lo stabilimento della Carbonifera Industriale Italiana che sarà poi la base della sua fortuna. Proprio in quel periodo che acquistò a Cornigliano Ligure lo scoglio di Sant'Andrea dove tra il 1881 e 1885 avrebbe fatto costruito lo splendido Castello Raggio. Tra il 1898 e il 1899 alcuni incidenti ferroviari in Liguria riconducibili alla qualità del carbone da lui fornito fecero scoppiare uno scandalo nazionale che offuscò temporaneamente la sua stella. La sua fortuna alla sua morte, stimata oltre i 200 milioni di lire, esclusi i beni immobili e i numerosi impianti industriali era a quel tempo il più grande patrimonio liquido d'Italia.
Edilio Raggio foi um empreendedor italiano, formado em direito e que invesitiu esforços na produção de carvão, ficando milionário. Tempos depois comprou uma rocha onde construiu um castelo muito belo. Em seguida um escândalo envolvendo a qualidade do carvão comprometeu a história do idustrial. Ainda assim morreu com uma das fortunas que representam o maior patrimônio líquido da Itália, cerca de 200 milhões de liras. (fonte: Wikipedia, 2010)