quinta-feira, 14 de maio de 2009

Na Itália de San Leo, 38 anos antes de 1896



Nos arredores do Ca' di Stacciarini, inúmeras são as lembranças do tantos acontecimentos e entrelaçamento de fatos. Esse telhado sustenta a proteção de uma história que remete à própria história da Itália e da infinita coragem que impulsionou Giovanna e Guglielmo a trazerem a continuidade da vida para terras brasileiras. Onde novos e distintos entrelaçamentos iriam ser acontecidos.

Foi aqui, nessas imediações, que em 1858 chega a Itália um bebê, nascido forte e 'machio' como se 'parla' em italiano, enchendo de felicidade o lar da família Stacciarini. Um parto tranquilo para uma criança tão graúda e forte, que chorava como se cantasse o hino da Itália.

No salão principal, os homens da família brindavam com vinho produzido a partir de uvas colhidas e fermentadas na própria fazenda.
Eram tempos mais tranquilos, após a conturbada tentativa de proteger Garibaldi e Anita.

A mãe após o parto, estava bem e como as italianas, um parto era apenas uma momento de 'felicitá'. As italianas não se intimidam com essas dores ou expectativas, ao contrário, são fortes demais, aprenderam isso com seus próprios homens. Além disso a parteira era uma antiga agregada, senhora de anos, e tida como da própria família, além de já ter feito mais de uma centena de partos.

O pai, sorria, gargalhava, e 'parlava' como vencedor de uma batalha. Um pouco ao efeito do vinho, também pouco importante para o êxtase de quem deleita o prazer de ter mais um filho. Não sabia porém, este pai, que seu filho não seria um simples italiano, que nasceria e morreria andando pelos quintais da fazenda. Para o pai, seu filho possivelmente, seria um político, um revolucionário, mas sem dúvida cuidaria da continuidade de sua geração, aqui em San Leo - seria um 'grande italiano'. San Leo teria mais um soldado para sua fortaleza. E netos, bisnetos, e tantas gerações continuariam zelando pelas passagens dos nomes, tão importante aos italianos naquela época.

Parte do desejo do pai, sim, se realizou, mas ele jamais poderia pensar que seu filho, aquele bebê, algum dia deixaria sua pátria, isso não teria sua aprovação, mesmo porque para sua história, tradição e amor a San Leo; estar ali era o presente maior que dava ao filho - seu nome, seu gên... seu lugar!

Quando o bebê parou de chorar depois de algum tempo, quase hora, e adormecido em seu primeiro sono em San Leo, todos puderam se acalmar e quitudes foram servidos a todos que estavam em casa.

Degustaram-se fortes queijos montanheses, misturados a especiarias e temperos típicos do paladar da família. Pães foram molhados no vinho e mais tarde, já pela hora do almoço, degustaram cordeiro e um pouco mais vinho. Já que o parto tinha acontecido logo na primeira hora da manhã.

Um caldo forte foi servido a mãe (que não se contentou, tinha tanta fome que comeu o que quis, e o quanto quis).

Que então percebe adentar em seu leito, recebendo um beijo terno do marido.
Entreolhando-se, ela sente a felicidade do esposo, e, sente um vento repentino de alguma das janelas.

Um presságio? (Os italiando não têm tempo para isso).

O marido lhe admira e pergunta:
- Come la mia moglie é forte... Voglio chiudere la finestra?Começando a se levantar em direção a janela para reter o vento que atravessava...
Então é interrompido pelo aperto da mão de sua mulher no braço:
- Non mio marito, è caldo qui....... continua qui, bisogno da te.

O marido olhou fixamente a ela, como se quisesse dizer algo mais.
Continuaram assim, se olhando, se namorando, com a mesma sensação dos amantes eternos, e a mesma impotência do homens que admiram suas amadas, cheirando-as e entendendo toda a graça do universo, externada ali, pela dádiva da vida, pelo 'parimento'.

Olham-se como se não houvesse tempo.

Ela sente o cheiro do vinho no marido e imagina sua ansiedade durante o parto. Pensando em sorrir, conhecedora do exagero do amado.

Olha para o bêbe e olham-se juntos..... numa linguagem telepática. Natural aos italianos, que falam demais, e muitas vezes o que mais importa fica por dizer.
Os italianos são um povo bastante ímpar, e entre suas tribos se entendem bem, gritam, reclamam, mas se amam.

Mas o olhar entre eles e o bêbe, era como se fosse de uma prece.
"Pois mesmo, que esse bêbe, talvez um dia precisasse desta prece".

O marido esperava o que ela queria dizer. Conhecia a esposa.

Até que ela, sentindo novamente o vento, olhou fixamente para o marido e disse:

- Guglielmo!
Entendendo, ele enche os olhos de lágrimas e lhe beija novamente:

- Questo è il nome di nostro figlio?
- - ela diz.
- Ma che belissimo nome!

Agora olham para Guglielmo, que ainda gozava do seu primeiro sono na Itália, fora do ventre de sua mãe.

Continuava ventando... e as janelas faziam ruídos que se misturavam ao tempo e ao espaço.

Sim, havia nascido Guglielmo Stacciarini, que seria registrado em San Leo, na primeira oportunidade que o pai fosse ao Comune.

Notas: A foto da postagem é verdadeira, atualmente este é o telhado da Ca' di Stacciarini, conhecida como Ca'del Santo, localizada em Colina, Comune de San Leo.
O telhado se degrada em níveis, e ainda não sofreu nenhum restauro significativo, mantendo-se fiel 'cúmplice' da história.

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