domingo, 16 de agosto de 2009

No porto de Gênova






O infinito era avistado no Porto de Gênova. O infinito de uma nova direção ou do que todas as direções podem possibilitar para quem imigra por necessidade e crença na ausência de oportunidades não oferecidas pelo seu país. A cruel partida de quem se vê diante das forças impostas pelas circunstâncias políticas e da guerra.

Era assim a visão do mar em Gênova. Apenas entreolhavam-se às vezes, num profundo silêncio. Velados os sentimentos de Giovanna e Guglielmo naqueles instantes que precediam o embarque ao Brasile.

Vagavam no seu profundo amor à pátria italiana, no amor de suas vidas e aos seus filhos, ainda pequenos italianinhos. Já, assim, impostos às mudanças do lado cruel da existência.
Sabiam da cumplicidade que sentiam ali, diante dos navios atracados, mas logo deveriam cumprir a decisão que haviam tomado.
Meu Deus! A decisão mais parecia uma sentença... era mesmo necessário cumprí-la?

Giovanna engolia silenciosa, o gosto jamais explicado daquele momento.
Guglielmo honrava da melhor maneira o papel a ser cumprido por um homem quando o destino foge ao seu controle, fortalecendo-se nas atitudes que deveriam ser tomadas. Só o mais bravo lutador sabia do peso de suas responsabilidades até ali.

As sete crianças ainda atônitas e temerosas eram sábias no profundo silêncio que também faziam.

A brisa do mar mediterrâneo musicava algum conforto querendo sonorar aos nossos bravos ancestrais que não havia do que se lamentar, nem deveriam, pois de alguma forma o caminho, mesmo imposto, era o caminho correto. Uma brisa suave e embebida no cheiro das correntes do mar, entregavam ao patriarca Guglielmo as forças de Netuno para conduzir sua família da melhor maneira possível até a terra Brasile.
Ele sabia que a viagem até a América não seria fácil. Tudo poderia acontecer. Falava-se em doenças nos navios, nas condições limitadas de provimentos, em lendas ou verdades, mas assustadoras. Sabia, Guglielmo, que não poderia oferecer medo a sua família, essa era a condição imposta a si mesmo.
Os filhos sempre estariam protegidos.
Por isso estavam ali no Porto de Gênova naquele instante.
Como o mais bravo guerreiro continha-se no amor pela sua bela Giovanna.

Ela não desviava o olhar fixo do infinito marítimo.
Não podia dizer nada, não conseguia sequer pensar. Se isso fizesse sabia correr o risco de passar a liderar a família de volta a San Leonardo e isso poderia não ser o melhor.

Esse mesmo infinito do Porto de Gênova, os fez silenciosos.

Até que ouviram um soar de sirene no porto....... Giovanna não queria se permitir às lágrimas... as crianças mais velhas adiantaram-se no ficar de pé. Os meninos seguiam a maestria do pai e queriam ajudar a mãe.
Angelo se adiantou e tomou Cirillo nos braços. Giuseppe puxou a mão de Eliseo. Rita reuniu as meninas, dando as mãos a Maria Gertrudes e a Florida.
Adiantaram-se na frente, como sabedores da velada e profunda insegurança da mãe e da difícil decisão do pai.
Tudo em profuso silêncio.
Guglielmo ficou mais atrás com Giovanna ainda sentada.

Ela quis sentir por mais um instante o cheiro da sua terra Itália!
Admirou a iniciativa dos seus filhos adiantando-se ao tiritar da sirene.
Dio Mio! - pensava se tinha mesmo que entrar naquele navio e curvar-se aos desígnios da natureza. Por que não podia se rebelar como era de sua alma italiana.
Guglielmo não sabia o que dizer e como interrompê-la de sua contemplação para a partida para o novo continente, esquivando-se também de suas próprias e comuns lembranças..... sua casa, seus familiares, suas histórias.
Guglielmo perdeu-se na absorção de tudo que haviam vivido até ali..... seus amigos, seus negócios, recordando-se de sua infância e de seus pais ensinando-o a trabalhar na terra. Estava longe....

De repente, Giovanna vendo a profunda absorção do marido e seus filhos organizadamente caminhando na direção do navio... postou-se de pé, ajeitou o longo vestido, atou o cabelo com uma faixa, e caminhou dando o braço a Guglielmo.

Ele respirou fundo.... por um instante havia se esquecido de onde estava...enxugou suas lágrimas..... agradecendo pela coragem de Giovanna.... ao risco de perderem o embarque....ergueu o corpo, apoiando o conforto do braço de sua amada, colocou seu chapéu e caminharam..... como se estivessem indo para uma valsa.

De costas, via-se o nobre casal de braços dados caminhando na direção dos sete filhos. E, ao fundo deles, a visão do navio, o Edilio Raggio e centenas de outros imigrantes já embarcando.

O infinito do Porto de Gênova perpetuou-se no olhar dessa família... até os dias de hoje.

Nota:

As fotos da postagem mostram o Porto a três anos atrás e foram registradas por um bisneto de Guglielmo e Giovanna.

4 comentários:

  1. Rogério que viagem!!!!!!!!!!
    Adorei tudo que vi e li.
    Deu a maior saudade.
    Sucesso.
    Abraço

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  2. Chorei ao ler... Cirilo meu biza... pai da minha vozinha Tereza... tenho o nome igual ao dela... Linda Sua pesquisa... estou começando uma também então passei por aqui para ler sobre o que você já pesquisou

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  3. Ola Tereza,

    qualquer fato novo ou uma história que saiba pela sua avó me conte para continuar a história, ou alguma foto da Giovanna.

    sempre que escrevo me emociono tambem, é tao importante entender a nossa historia nao, um beijo grande e ate mais!

    nao desista da pesquisa é um tempo tão importante e nos faz tao bem.

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  4. Sandra,

    viajar é preciso nao?
    quando vamos para a Italia hehe

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